Em 2014 a Alegrar completa 10 anos e, com imensa satisfação, apresentamos aqui sua 13ª edição.  Buscando proliferar e multiplicar encontros, nos quais vibra a procura por acontecimentos notáveis, ainda que sutis, capazes de sinalizar a irrupção do novo.

Em Por que é o corpo sem órgãos, Kuniichi Uno parte de Tatsumi Hjikata, dançarino e coreógrafo japonês, criador de uma nova dança que os ocidentais chamamos de butô para tratar de corporeidades inauditas surgidas nas artes e na filosofia. O corpo dançante de Hijikata encontra-se como corpo sem órgãos de Artaud e Deleuze, o corpo suscitado pela imagem cristal no cinema moderno, o corpo em imanência, tomado como fonte de perguntas potencializadoras de Espinosa, e com o corpo capaz de resistir de Foucault. Tradução de Cíntia Vieira da Silva.

Deniz Alcione Nicolay constrói um Bestiário das tipologias do educador, como um “conjunto de metáforas da condição docente”. Inspirado na “prosa medieval do Livro das bestas de Raimundo Lúlio” e em ressonância com o Nietzsche de Gilles Deleuze (1965), desenha personagens imaginários, partilhando “problemas reais, criando planos psicodélicos da ação pedagógica”.

Em Quero viver com os lobos: apologia ao silêncio e o ridículo humano, de Andreia Marin e Paulo Manaf, temos “o pressentimento de um híbrido onde antes instalávamos humano e animal, inteiramente distintos.” Provocantes encontros com gatos (de Derrida, Syd Barrett e Handke), lobos (de Rowlands e dos autores) e um cão sem nome (de Pietsch Lima). Silêncio.

Da amizade nietzschiana: por uma psicologia nômade performatiza o conceito de amizade em Nietzsche, uma vez que resulta do trabalho conjunto de Mákellen Gonçalves Dias; Lilian Ester Winter; Luciano Bedin da Costa e Oriana Holsbach Hadler. Este complexo conceito pragmático, indicador de modos de constituir a si junto a outros (e, com eles, tornar-se outro) é apresentado na disjunção entre proximidade e conflito, entre companhia e solidão, entre cultivo de afinidades e sintonias, mas também de diferenças e distâncias.

A improvisação em Jogando no Quintal e a experiência do “milmaravilhoso” analisa a experiência do espetáculo/evento teatral paulistano “Jogando no Quintal”. Nela, Thaís Carvalho Hércules investiga as singularidades que Jogando no Quintal produz ao ressignificar a improvisação, inventando-a pela ótica do palhaço.

Em Sobre Saltos: entre a sola e o salto alto do sapato dela existe a imensidão, Cleiton Zóia Münchow performatiza acontecimentos na cidade de Coxim, em torno de sapatos que traçam percursos dançantes e performáticos, produzindo diferenciações, contaminando “com a dúvida que empurra para fora do armário e fazer a todxs perguntarem-se a si mesmxs: ‘afinal, o que pode um salto?’.”

Maria dos Remédios de Brito nos apresenta Escrita como abertura vital: por entre linhas deleuzianas, abordando “a ideia de que a escrita opera numa zona de experimentação na qual a vida torna-se uma profusão aberta de linhas de fuga e de agenciamentos múltiplos.” Escrita como “campo aberto para novas paisagens-textos, que exercita estranhamentos, acidentes, decaimentos, entusiasmos, o que faz dessas paisagens um efetivo devir-escrita.”

Ágora, poema de Daniel Delatin, revisita imagens de um Rio de Janeiro em guerrilha e festa, procurando traduzir os acontecimentos ético-políticos de 2013.

Em Pensar à intempérie. A crítica exposta ao risco da experimentação, Eduardo Pellejero problematiza o papel da crítica de arte face à tensão dialética entre as formas canônicas do fazer artístico (repartição em gêneros, códigos estilísticos, procedimentos técnicos usuais ou recomendáveis) e as inovações e rupturas trazidas pelas experimentações artísticas por vezes de vanguarda. Para colaborar com as artes na tarefa de despertar novas maneiras de sentir, de imaginar e de agir, a crítica não deve se limitar a julgar a experimentação nos moldes das obras consagradas ao longo da história, mas tampouco precisa desprezar aspectos da produção artística vinculados à tradição.

Kátia Maria Kasper e Cíntia Vieira da Silva