Editorial 01
Alegrar, disponível a partir de agosto de 2004 na internet, é uma revista anual criada em conexão com a concepção espinosista de alegria como aumento de potência. Desse ponto de vista, no qual aumento de potência tem a ver com o desenvolvimento das inúmeras partes que compõem os corpos (incluindo os órgãos perceptivos) e de variados modos de pensar, Alegrar pretende ser um instrumento para a proliferação de conexões entre os mais diversos campos da produção artística, filosófica e científica, um espaço para mostrar e produzir bons encontros.
Neste número contamos com um artigo do professor Luiz Orlandi, em que ele aponta as principais linhas em que se dividem as investigações em torno do corpo, demorando-se mais na exposição do conceito de corpo sem órgãos, tal como formulado por Deleuze e Guattari, e dos problemas de ordem prática que este suscita, articulados a uma renovada concepção de prudência, entendida, dentre outras coisas, como precisamente uma arte de seleção dos encontros.
Temos um texto e imagens que nos contam um pouco da atuação de duas artistas plásticas Cinthia Marcelle e Marilá Dardot, com um trabalho que propicia a reunião de pessoas em torno de um jogo do qual, extraordinariamente, todos saem contentes: O Grande Bingo.
Ainda com imagens e texto, um pesquisador – Christian Pierre Kasper – nos fala de um encontro ocorrido em uma de suas andanças entre moradores das ruas da megalópole paulistana, evidenciando a miríade de rearranjos e invenções com os quais criam para si territórios em meio ao espaço público (entre nós, freqüentemente tomado por terra de ninguém): o encontro com Luciano. (Disponível em português e francês).
Inspirada também na potência dos encontros, Maria Rosa R. Martins de Camargo nos enviou uma carta que nos apresenta um conjunto de outras cartas, escritas e trocadas por mulheres participantes de um grupo no qual aprendiam a ler e escrever, em Rio Claro (SP).
Sob o signo da territorialidade, apresentamos um conto de Álvaro Labarrère em que aparece a figura de um cartógrafo de terras imaginárias (ou diríamos virtuais?) com sua tradução para o português e um ensaio do tradutor – Damian Kraus – a respeito da criação desse espaço entre duas línguas e do estado de traduzibilidade. (Disponível em português e espanhol).
Hay que crear tensión: o jogo de Leo Bassi envolve o encontro de Kátia Kasper com esse clown fabuloso que vive na Espanha. Inicialmente, a autora faz algumas considerações a respeito da contribuição de Leo Bassi para a inovação da arte clownesca e nos mostra como ele cria um modo próprio de fazer, relacionando tradição e contemporaneidade. Esse assunto se insinua ainda a partir do texto Experimentações Clownescas (disponível em português e inglês), síntese de uma pesquisa que promete vir a ser revisitada em artigo futuro.
Alegrar traz também um texto de Cíntia Vieira da Silva em torno da articulação entre crueldade e inocência, tendo em vista a proliferação de alianças criadoras no pensamento como um procedimento capaz de incrementá-lo, dotá-lo de novas armas e, ao mesmo tempo, subtraí-lo a esforços reflexivos ou meramente críticos.
Por fim, a revista abriga um texto de Clarisse Alvarenga, que sugere a tensão criada pelas imagens de realizadores indígenas brasileiros a partir do momento em que olhares de espectadores brancos são lançados sobre elas, preocupando-se com a possibilidade de surgimento de outros olhares, mais atentos às imagens produzidas.
Cíntia Vieira da Silva, Clarisse Alvarenga, Kátia Kasper