Editorial

A revista Alegrar chega à 20a edição afirmando a potência da criação, linha errante do pensamento. E a urgência da proliferação dos bons encontros, da alegria como aumento de potência de agir, agenciando canais para um certo vento, que chama em assovio. Compõe essa edição o dossiê Outras partituras: poéticas do movente, proposto e organizado por Luciano Bedin da Costa e Eduardo Guedes Pacheco. Com os organizadores, o desejo de que “sejamos suficientemente resistentes para nos inventarmos com as forças que aqui estão. É o caso do que estamos chamando de movente, essa força meio sem nomee- cara que nos joga para o passo além de nós mesmos e do rebanho midiático que nos faz tagarelar um mundo sem saída”. Movente como “o rumorejar incessante das máquinas em que somos inexoravelmente forjados a existir”, extraindo “deste rumor uma poética”. Composições em partitura ganham fôlego e evocam “produções de respiro” “e a experiência de um resistir a todo custo”. Na Apresentação que introduz o dossiê, os organizadores comentam cada um dos textos, mostrando suas articulações internas e suas diferenciações.

Além do conjunto de textos do dossiê, o presente número traz ainda cinco artigos bastante diversos e três poemas.

As mil e uma histórias – composições para uma oficina de atividades com trabalhadores de Serviços Socioassistenciais, de Christiane Siegmann e Tania Mara Galli Fonseca, propõe, conforme as autoras, “a visibilizar uma intervenção didático-assistencial, que busca na experiência estética a potência do oficinar, mas ao rememorá-la estamos, também, abrindo seus arquivos para deixar à mostra as limitações e tensões desse fazer e as forças paradoxais que atravessam os corpos ali implicados.” As oficinas e seus ecos se revelam como uma “trama tecida por Sherazade”. Aqui, o espaço de narrar – prolifera contatos e emite sonoridades, um convite “a cada gesto, movimento, silêncio e murmúrio”.

Leandro Fernandes Dantas, nos apresenta O cepticismo de Paul Veyne: das “grandes questões” aos “pequenos fatos”.No artigo, o autor afirma: “Uma frase de Paul Veyne, resumidamente, demonstra o modo como nosso autor interpreta e se posiciona sobre o saber humano: “paz aos pequenos fatos; guerra às generalidades” (Ibid. p. 80). Paul Veyne duvida de todas as pretensas verdades gerais, assim como das grandes verdades assumidas como intemporais. Mas não duvida de toda a verdade, não duvida, por exemplo, da inocência de Dreyfus, nem de que as câmaras de gás existiram.”

Em “Quem quer brincar?”: A poesia entre a vida e a morte, o tempo e a transgressão, Ramiro Faria de Melo e Souza, William Pereira Penna e João Batista de Oliveira Ferreira propõem um jogo, inspirados na roda de poesia “Pelada Poética”, que acontece na cidade do Rio de Janeiro, para pensar a articulação entre poesia e trabalho vivo. Aliados a poetas, poemas e com a roda de poesia mencionada, analisam a relação do trabalho poético com o tempo, com a transgressão e com a morte. Neste jogo em que a poesia é ela própria argumentação, reverberam versos. Na roda, ao lado e tão próximos de Leminski, Maurice Blanchot, Manoel de Barros e outros, o texto sussurra intensidades e

silêncios. A poesia entra em cena, provocando o tempo e a morte onde “Criar é ir de encontro ao real. É chocar-se…”

No ensaio Jacques e a revolução: o tabuleiro de quadrantes alternados, Theotonio de Paiva nos instiga a pensar a “experiência dramatúrgica de Ronaldo Lima Lins, cuja peça, Jacques e a Revolução ou Como o criado aprendeu as lições de Diderot, coloca em relevo a natureza das relações pessoais e sociais, com as periódicas permutas entre o opressor e o oprimido. Nessa condição, estabeleceria um diálogo intenso com a obra do filósofo francês, adotando, contudo, uma vertente profundamente autoral”. Acompanham o texto fotos do espetáculo “Jacques e a revolução”, dirigido pelo autor.

Em Dançando com Zaratustra, a autora, Adriana Maimone Aguillar, acompanha Zaratustra em suas andanças. Escrita agenciando encontros nos quais dançam Nietzsche, Zaratustra e as palavras. A autora afirma: “Zaratustra dita palavras que ressoam em mim” e compõe um texto com aliados, chamando para a dança elementos que propõe o movimento, quase um baile de muitos. Zaratustra “escreve a vida” e “ele fala sobre tanta coisa…”

Temos ainda os Três poemas, de Alexandre Filordi: Caso com Keats, O rapto e Linguagem Corporal. Sem comentários, convidamos para a leitura.

Kátia Maria Kasper

Juliana Gisi